Quem Sou


Samuel Rodrigues , servindo a Deus na Igreja Assembleia de Deus, Min Madureira em Ribeirão Preto, casado com Cleide Rodrigues, Pregador da Palavra, Professor de Teologia, Blogueiro, Coordenador de Projetos de Pesquisa, contato pelo Whatsapp. ou se preferir ligue para 55 16 994542319

quinta-feira, 8 de abril de 2010

CANSEI

Por Ricardo Gondim

Cansei! Entendo que o mundo evangélico não admite que um pastor
confesse o seu cansaço. Conheço as várias passagens da Bíblia que
prometem restaurar os trôpegos. Compreendo que o profeta Isaías ensina
que Deus restaura as forças do que não tem nenhum vigor. Também estou
informado de que Jesus dá alívio para os cansados. Por isso, já me
preparo para as censuras dos que se escandalizarem com a minha
confissão e me considerarem um derrotista. Contudo, não consigo
dissimular: eu me acho exausto.
Não, não me afadiguei com Deus ou com minha vocação. Continuo
entusiasmado pelo que faço; amo o meu Deus, bem como minha família e
amigos. Permaneço esperançoso. Minha fadiga nasce de outras fontes.

Canso com o discurso repetitivo e absurdo dos que mercadejam a Palavra
de Deus. Já não agüento mais que se usem versículos tirados do Antigo
Testamento e que se aplicavam a Israel para vender ilusões aos que
lotam as igrejas em busca de alívio. Essa possibilidade mágica de
reverter uma realidade cruel me deixa arrasado porque sei que é uma
propaganda enganosa. Cansei com os programas de rádio em que os
pastores não anunciam mais os conteúdos do evangelho; gastam o tempo
alardeando as virtudes de suas próprias instituições. Causa tédio
tomar conhecimento das infinitas campanhas e correntes de oração;
todas visando exclusivamente encher os seus templos. Considero os
amuletos evangélicos horríveis. Cansei de ter de explicar que há uma
diferença brutal entre a fé bíblica e as crendices supersticiosas.

Canso com a leitura simplista que algumas correntes evangélicas fazem
da realidade. Sinto-me triste quando percebo que a injustiça social é
vista como uma conspiração satânica, e não como fruto de uma
construção social perversa. Não consideram os séculos de preconceitos
nem que existe uma economia perversa privilegiando as elites há
séculos. Não agüento mais cultos de amarrar demônios ou de desfazer as
maldições que pairam sobre o Brasil e o mundo.

Canso com a repetição enfadonha das teologias sem criatividade nem
riqueza poética. Sinto pena dos teólogos que se contentam em
reproduzir o que outros escreveram há séculos. Presos às molduras de
suas escolas teológicas, não conseguem admitir que haja outros ângulos
de leitura das Escrituras. Convivem com uma teologia pronta. Não
enxergam sua pobreza porque acreditam que basta aprofundarem um
conhecimento ?científico? da Bíblia e desvendarão os mistérios de
Deus. A aridez fundamentalista exaure as minhas forças.

Canso com os estereótipos pentecostais. Como é doloroso observá-los:
sem uma visitação nova do Espírito Santo, buscam criar ambientes
espirituais com gritos e manifestações emocionais. Não há nada mais
desolador que um culto pentecostal com uma coreografia preservada, mas
sem vitalidade espiritual. Cansei, inclusive, de ouvir piadas contadas
pelos próprios pentecostais sobre os dons espirituais.

Cansei de ouvir relatos sobre evangelistas estrangeiros que vêm ao
Brasil para soprar sobre as multidões. Fico abatido com eles porque
sei que provocam que as pessoas ?caiam sob o poder de Deus? para tirar
fotografias ou gravar os acontecimentos e depois levantar fortunas em
seus países de origem.

Canso com as perguntas que me fazem sobre a conduta cristã e o
legalismo. Recebo todos os dias várias mensagens eletrônicas de gente
me perguntando se pode beber vinho, usar ?piercing?, fazer tatuagem,
se tratar com acupuntura etc., etc. A lista é enorme e parece
inexaurível. Canso com essa mentalidade pequena, que não sai das
questiúnculas, que não concebe um exercício religioso mais nobre; que
não pensa em grandes temas. Canso com gente que precisa de cabrestos,
que não sabe ser livre e não consegue caminhar com princípios. Acho
intolerável conviver com aqueles que se acomodam com uma existência
sob o domínio da lei e não do amor.
Canso com os livros evangélicos traduzidos para o português. Não tanto
pelas traduções mal feitas, tampouco pelos exemplos tirados do golfe
ou do basebol, que nada têm a ver com a nossa realidade. Canso com os
pacotes prontos e com o pragmatismo. Já não agüento mais livros com
dez leis ou vinte e um passos para qualquer coisa. Não consigo
entender como uma igreja tão vibrante como a brasileira precisa copiar
os exemplos lá do norte, onde a abundância é tanta que os profetas
denunciam o pecado da complacência entre os crentes. Cansei de ter de
opinar se concordo ou não com um novo modelo de crescimento de igreja
copiado e que vem sendo adotado no Brasil.

Canso com a falta de beleza artística dos evangélicos. Há pouco
compareci a um show de música evangélica só para sair arrasado. A
musicalidade era medíocre, a poesia sofrível e, pior, percebia-se o
interesse comercial por trás do evento. Quão diferente do dia em que
me sentei na Sala São Paulo para ouvir a música que Johann Sebastian
Bach (1685-1750) compôs sobre os últimos capítulos do Evangelho de São
João. Sob a batuta do maestro, subimos o Gólgota. A sala se encheu de
um encanto mágico já nos primeiros acordes; fechei os olhos e me senti
em um templo. O maestro era um sacerdote e nós, a platéia, uma
assembléia de adoradores. Não consegui conter minhas lágrimas nos
movimentos dos violinos, dos oboés e das trompas. Aquela beleza não
era deste mundo. Envoltos em mistério, transcendíamos a mecânica da
vida e nos transportávamos para onde Deus habita. Minhas lágrimas
naquele momento também vinham com pesar pelo distanciamento estético
da atual cultura evangélica, contente com tão pouca beleza.

Canso de explicar que nem todos os pastores são gananciosos e que as
igrejas não existem para enriquecer sua liderança. Cansei de ter de
dar satisfações todas as vezes que faço qualquer negócio em nome da
igreja. Tenho de provar que nossa igreja não tem título protestado em
cartório, que não é rica, e que vivemos com um orçamento apertado. Não
há nada mais desgastante do que ser obrigado a explanar para parentes
ou amigos não evangélicos que aquele último escândalo do jornal não
representa a grande maioria dos pastores que vivem dignamente.

Canso com as vaidades religiosas. É fatigante observar os líderes que
adoram cargos, posições e títulos. Desdenho os conchavos políticos que
possibilitam eleições para os altos escalões denominacionais. Cansei
com as vaidades acadêmicas e com os mestrados e doutorados que apenas
enriquecem os currículos e geram uma soberba tola. Não suporto ouvir
que mais um se auto-intitulou apóstolo.

Sei que estou cansado, entretanto, não permitirei que o meu cansaço me
torne um cínico. Decidi lutar para não atrofiar o meu coração.

Por isso, opto por não participar de uma máquina religiosa que fabrica
ícones. Não brigarei pelos primeiros lugares nas festas solenes
patrocinadas por gente importante. Jamais oferecerei meu nome para
compor a lista dos preletores de qualquer conferência. Abro mão de
querer adornar meu nome com títulos de qualquer espécie. Não desejo
ganhar aplausos de auditórios famosos.

Buscarei o convívio dos pequenos grupos, priorizarei fazer minhas
refeições com os amigos mais queridos. Meu refúgio será ao lado de
pessoas simples, pois quero aprender a valorizar os momentos
despretensiosos da vida. Lerei mais poesia para entender a alma
humana, mais romances para continuar sonhando e muita boa música para
tornar a vida mais bonita. Desejo meditar outras vezes diante do
pôr-do-sol para, em silêncio, agradecer a Deus por sua fidelidade.
Quero voltar a orar no secreto do meu quarto e a ler as Escrituras
como uma carta de amor de meu Pai.

Pode ser que outros estejam tão cansados quanto eu. Se é o seu caso,
convido-o então a mudar a sua agenda; romper com as estruturas
religiosas que sugam suas energias; voltar ao primeiro amor. Jesus
afirmou que não adianta ganhar o mundo inteiro e perder a alma. Ainda
há tempo de salvar a nossa.

Soli Deo Gloria.

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